Filhos e o uso de celulares

Não há dúvida de que os telefones celulares são uma ótima maneira de ficar em contato a qualquer hora, em qualquer lugar. Mas o seu filho tem idade suficiente para ter um? É uma decisão difícil para muitos pais, porque não se refere apenas à idade. Você precisa saber quais são as consequências do uso do celular sobre os seus filhos, antes de deixar-se influenciar pela maioria social e decidir adicionar outra linha a sua conta de telefone.

Acredito que eu sou uma das poucas mães que tem um filho de 12 anos, o qual não tem um celular. Meu filho já me perguntou algumas vezes: “Mãe, eu posso ter um celular?” A minha resposta é sempre sim, pois não quero lidar contra argumentos: “Sim, claro, mas não agora!”. De fato, não vejo a necessidade de uma criança de 12 anos ter um telefone móvel e tenho motivos para isso.

Muitos pais argumentam que dão um telefone celular aos filhos menores de idade, pois precisam se comunicar com eles. Bem, dependendo da situação, esse argumento pode ser válido; mas a questão é: se o objetivo do telefone cedido à criança é apenas para ligações, por que lhe é ofertado o melhor produto que existe no mercado? Inclusive, muitas vezes, melhor do que o dos pais. A resposta é simples: porque os telefones de hoje em dia fazem tudo, inclusive ligações, mas a opção “ligar” é a menos usada. O celular serve para acessar redes sociais, baixar aplicativos, navegar na internet, conversar com amigos, jogar ou tirar fotos.

Bem, antes de ressaltar os motivos contra o uso precoce de celulares por crianças, quero deixar claro que a época em que vivemos, tecnológica e dinâmica, tem outra forma de comunicação. Não nos expressamos mais com a mesma frequência verbal do século 20, e sim “com os dedos”. Ir contra as tendências sociais é um verdadeiro desafio, pois o uso de celulares por crianças só tende a crescer. Estudos recentes na Universidade da Califórnia mostram que 21% das crianças abaixo de oito anos já usam celulares; e 78% das crianças com idade entre 12 e 17 anos já têm o seu próprio telefone móvel.

Alguns bons motivos para adiar o uso do celular:

  1. Nossos filhos têm pouca noção sobre privacidade. Em um mundo de exposição, ser discreto para eles é algo quase impossível. Eles compartilham muitas informações pessoais pela internet, desde endereço da escola, de casa. Atualizam constantemente o check-in em suas redes sociais, postando fotos do que fazem e mesmo de onde estão. Sem falar no excessivo volume de fotos íntimas que compartilham sem a noção real do perigo desse ato.
  2. Devido a imaturidade inerente à idade e em razão do uso inadequado da tecnologia que tem em mãos, a criança tem a ilusão de liberdade, da ausência de controle pelos pais. Com isso começa a agir quebrando regras, ousando mais, pois não existe punição, nem supervisão do que ela faz na companhia de seus aparelhos celulares. Como a liberdade nas mãos de pessoas imaturas gera ações passíveis de arrependimento, com os nossos filhos, isso não é diferente. “Minha filha de 13 anos disse que a sua amiga já enviou foto sem roupa para um colega da escola. Meu receio é de que não tenha sido a amiga quem fez isso, mas sim ela; mas como vou saber a verdade?” – Diz Joanna*, mãe da menina citada acima.
  3. O uso de telefone celular entre crianças facilita a prática de abuso por bullying entre elas, pois uma difamação (verdadeira ou falsa) pode facilmente se espalhar através das mídias sociais, gerando constrangimento e isolamento para a vítima.
  4. O isolamento social é um dos maiores reflexos do uso exagerado de aparelhos celulares, pois a facilidade de enviar uma mensagem de texto, uma gravação de voz ou um pequeno vídeo diminui o contato “cara a cara” entre os amigos. “Nos falamos por mensagem todos os dias!” – diz Clara*, de 12 anos, referindo-se à “interação social” com a melhor amiga.
  5. Quanto maior for o uso do telefone celular por um estudante, menores as notas na escola, e maior a ansiedade. Esta fórmula é simples: a energia vai para onde se concentra a atenção! Como as crianças estão concentradas em jogos, chats ou navegar em sites, sobra pouco ou nenhum tempo para dedicar-se aos estudos. O resultado é um baixo rendimento escolar e um alto índice de ansiedade.
  6. A ansiedade gerada nas crianças pelo uso de celulares merece um parágrafo a mais, pois a necessidade” de saber sobre tudo o que os amigos estão fazendo, aumenta a cada postagem. Sem falar na comparação social que é inerente à facilidade de  acesso à vida do outro. “As pessoas estão sempre fazendo coisas mais divertidas do que eu” – diz João*, 13 anos.

Conversei com algumas mães brasileiras sobre esse tema, vamos ver como elas lidam ou lidaram com o assunto dentro de casa:

Camila Graciela mora em Vancouver no Canadá e é mãe de uma menina de 16 anos.
“Eu nunca controlei o uso de quaisquer dispositivos usados por minha filha, mas gostaria de ter controlado. Quando os filhos ficam mais velhos, é muito mais difícil tentar implementar regras e acompanhar o uso, somado ao fato de que nós trabalhamos fora, e não temos muito tempo para estar em casa. É muito difícil controlar. Quando minha filha tinha 10 anos, meu ex-namorado instalou um Net Nanny* em seu laptop, mas ela descobriu e me contou. Ela me contou porque confiava em mim. Eu a apoiei na época, mas não tenho certeza se agi corretamente. Ela é uma boa menina, apenas gasta muito tempo com o seu celular e demais dispositivos. Eu gostaria de poder mudar isso, mas ela já está quase com 17 anos. Não tenho certeza se fiz a coisa certa ou se falhei”.

Andressa Kimura-Rosa mora no Reino Unido e é mãe de uma menina de 11 anos.
“Minha filha adora internet. Acho que os computadores, tablets e telefones têm ocupado um espaço grande na vida das crianças dessa geração e, como tudo na vida, é importante ter equilíbrio no uso desses aparelhos, para que o uso excessivo de tecnologia não consuma o tempo dos nossos filhos e afete a vida social deles. Aqui em casa, eu valorizo muito o tempo em família, e as regras para tempo no computador variam de acordo com as atividades escolares, além de estarem adaptadas à idade da minha filha. Ela ganhou o primeiro tablet aos nove anos. Hoje ela está no ensino médio, então usa o celular e o computador também para trabalhos escolares. Eu ainda não liberei o uso das redes sociais e, geralmente, usamos o Skype para que ela fale com os familiares distantes. As regras que eu imponho são: que todas as tarefas escolares e domésticas estejam feitas antes de jogar no computador, além disso, o horário de ir para a cama deve ser cumprido. Hoje em dia, o uso de celulares e afins é quase inevitável, acredito que balancear as atividades, para que isso não substitua o divertimento das brincadeiras ao ar livre, os passeios de bicicleta, a conversa com os amigos e o contato social, é o segredo de uma infância ou adolescência feliz”.

Anelise Farias mora no Canadá, é mãe de um menino de 14 e de uma menina de 12 anos.
“Aqui em casa as regras para o uso de eletrônicos são simples: se é durante o período de aulas, eles só usam o computador em dias de escola, se for para fazer tarefa de casa ou estudar. Nos fins de semana, se todas as tarefas estiverem em dia, eles podem jogar. Em época de aulas, os celulares “dormem” no meu quarto a partir das 21 horas. Durante as férias, está quase liberado o uso, a não ser que eles estejam tendo algum problema conosco, aí a consequência, normalmente, é o confisco de celular e o bloqueio do computador”.

Karla Klaros mora no Canadá e é mãe de um menino de 15 e de uma menina de 20 anos.
“Eu nunca controlei o uso do celular pela minha filha mais velha. Ela sempre tirou notas boas, é bem ajuizada e dedicada na universidade. Já com o meu filho adolescente o negócio é diferente! Ele não é nada acadêmico, então, nos dias de aula, fica sem celular até terminar as tarefas escolares. Quando eu vou dormir, confisco o celular. Depois do recebimento do primeiro boletim dele, tirei o celular de vez. Agora, como ele está de férias, devolvi”.

Caso você já tenha dado um telefone aos seus filhos, entenda que regras e limites para o uso são necessários. Aqui algumas dicas para minimizar os problemas que o uso precoce pode gerar:

● Não permita que seus filhos levem seus celulares para a cama. Na hora de dormir, eles devem desligar os aparelhos e deixá-los em outro cômodo da casa.
● Controle o uso deixando claro por quanto tempo podem ter acesso ao telefone.
● Crianças desocupadas usam mais o telefone, então dê tarefas a elas: atividades físicas, dever de casa, ajudar em tarefas domésticas, passeios com a família, etc.
● Durante um encontro pessoal (almoço em família, cinema, teatros), não é permitido o uso de telefones, pois não existe nada mais desagradável do que ter alguém à sua frente com a cabeça baixa, olhando para uma tela e não para você.
● Utilize a mesada dos filhos (caso eles tenham) para ajudar a pagar a conta do telefone. Ensinar responsabilidades sobre os benefícios cedidos é fundamental.

*Nomes fictícios para preservar a identidade das entrevistadas

Lila Rosana nasceu em Belém do Pará, onde formou-se em psicologia clínica e organizacional. Tem especializações em educação infantil, ludoterapia e estresse pós traumático. Atualmente vive em Vancouver, no Canadá.  Além disso, Lila tem muitos interesses: aos nove anos de idade ela desenhava com grafite, aos dez anos pintava em tela e com tinta a óleo, estudou teatro quando criança, na adolescência fez dança moderna e agora adulta faz aulas de pintura, scrapbooking e fotografia. Lila colabora com a nossa revista desde a primeira edição e escreve na coluna “Conversando com Lila”.

lila-conversandocomospais.blogspot.com

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Sobre Claudia Bömmels

Claudia Bömmels é fotógrafa, contadora de histórias, viajante e editora da Brasileiros Mundo Afora. Atualmente ela mora em Nanjing na China.

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